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Sigo gostando de mim na melhor companhia: a minha!

  • Foto do escritor: Danielle Apocalypse
    Danielle Apocalypse
  • 18 de jan. de 2024
  • 4 min de leitura

Ele não tem ideia de mais nada a meu respeito. Talvez nunca tenha realmente prestado a devida atenção. Nunca irá compreender.


Quem não se compromete com o exercício da autoanálise e não possui autoconhecimento, já está acostumado a não se aprofundar, viver nas superfícies, passando apenas por aquilo que lhe é tangível.


As questões relacionadas ao outro não lhe diz tanto respeito, nem mesmo as suas. É mais fácil ignorar, sem questionar. Coisas acontecem o tempo todo, com todo mundo. Não tem muita explicação. Segue em frente ou, simplesmente, fica onde está.


Não deixa de ser doloroso. Porém, se vitimizar ao invés de agir, parece mais gratificante. O alimento é atenção recebida, pela empatia e sentimento de culpa do outro. A culpa é da vida.


Mas ele nunca vai saber o quanto eu me preocupei e cuidei para que as coisas ficassem no mesmo lugar. O quanto me esforcei, todos esses anos, para que tudo mudasse o menos possível, para que as ausências não se tornassem grandes abismos para nós dois.


O quanto me fiz presente, desejando estar ausente, e me desvencilhar das obrigações, afrouxando nós, sem que fossem desatados subitamente.


Ele nem imagina que o aperto no meu peito crescia a cada reencontro, que o coração acelerava a cada alerta de que algo não ia prestar ou ia bem, que a angústia me dominava a cada tentativa de controle de situações que já não havia como controlar.


Longe de sua vista, minha vida continuava, meu cabelo crescia e o corte mudava, tinha momentos de alegria, outros calmos e que, às vezes, me mantia mais afastada, calada, concentrando-me em uma vida prática e, de alguma forma, equilibrada, sem dar atenção à necessidade de ser compreendida ou amada.


Ninguém sabe quantos livros pude ler, quantos lugares me propus a conhecer, a quantidade de pessoas que permiti entrar e sair da minha vida, sem que pudessem se intrometer, quais os assuntos me interessam agora, os filmes favoritos que assisti. 


Ele não sabe que não tem um dia sequer que não penso nele, que não tem uma noite que ele não invada meu sono ou que acordo de repente com ele em um sonho. Ele nem imagina que mesmo tendo ido embora, eu nunca parti de verdade.


Talvez ele não possa compreender, que mesmo o amando não pude ficar e, que depois, mesmo voltando, não consegui suportar.


Que mesmo longe, desejando que seguíssemos em frente, conservava a curiosidade em saber se o seu coração ficaria mais tranquilo, se sua vida iria mudar, se seria capaz de amar de novo e se um dia seríamos mesmo capazes de nos libertar.


Ele nem imagina, que no fundo alimentava a certeza de que, de alguma forma, seríamos capazes de inventar uma maneira de viver nossas vidas separadas, continuando próximos, cuidando um do outro, conectados.


Nem ele, nem ninguém sabe quanta coisa eu planejei para mim, para ele, ou

para nós. O quanto tive que me esforçar, me afastar e me isolar para conseguir me reorganizar e dar continuidade a todos os meus projetos. Que ainda faço tudo isso, todos os dias.


Do quanto eu abri mão e ainda sigo sacrificando para estar onde estou, conseguir o que eu tenho, dar aos meus filhos o que eles precisam e ainda assim, ter ânimo para me manter forte.


Ele não sabe quantas vezes errei, duvidei de mim mesma e de tudo, escorreguei e me senti sozinha. Quantas vezes tive vontade de ligar e contar meu dia, chorar de dor ou de raiva, rir de uma bobagem, contar uma fofoca, recomendar uma série ou um filme. 


Que tenho sentido vontade de dormir o tempo todo, mesmo sem sono. Que fico noites acordadas inventando outras vidas ou imaginando coisas que ele possa estar vivendo sem mim. Se foi mesmo melhor assim.


Ele não sabe, mas eu tenho sentido mais saudade. Uma saudade do que não sei o que. Saudade do que nunca tive, de coisa que imaginei um dia ter. Que simplesmente nunca deixei de pensar em nós e em tudo que nos foi inalcançável.


Que preciso me esforçar para lembrar de tudo que me fez mal, que achava ruim e não queria mais, só para curar essa dor. Que tento me concentrar na lembrança do que me fez partir, do tempo que perdi, da necessidade de agir.


Que tenho voltado a escrever para continuar funcionando.

Ele não tem ideia do quanto estou aprendendo a não sobrecarregar meu coração, a não exigir demais de mim, não me deixar levar pela loucura ou emoção, de sucumbir a vitimização e a não me tornar prisioneira de culpas ou autossabotagem. 


Há poucos meses, em muitos anos, eu pude entender que preciso resolver a minha dor, sem precisar sofrer junto a dor alheia. Que não tenho controle da minha vida e nem posso controlar a do outro para solucionar ou amenizar a minha.


Hoje eu percebo quanta coisa deve mudar primeiro dentro de mim, independente do que mudou ou não para ele, pois já não é da minha conta as suas escolhas. Tampouco deixar que sua vida afete a minha. Ele não precisa saber sobre nada disso. 


Ele não sabe que tenho estado só, assombrada pela devastadora sensação de solidão e desamparo, mas que tenho melhorado a cada dia. Ele não sabe que desde que escolhemos não mais compartilhar coisas sobre nós, eu tive que aprender a me tornar minha melhor companhia. 


E que mesmo sentindo falta, às vezes meio triste, essa foi uma escolha só minha, sem a necessidade de buscar em outro, a força para gostar de novo de mim. Ele nem imagina que me derrubando, ele me ensinou a levantar e seguir.

(Inspirado no texto “Minha melhor companhia” do Livro QUANDO AS PALAVRAS SE ABRAÇAM, da poeta e escritora Marla de Queiroz / @marladequeiroztextos)

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